Agência aposta em valorização de residuos industriais para uso em saúde, construção e agricultura

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Agência aposta em valorização de residuos industriais para uso em saúde, construção e agricultura

Muitas matérias-primas são extraídas da natureza, usadas e depois descartadas. Para quebrar esse ciclo, algumas indústrias estão considerando uma abordagem circular, focada no reaproveitamento. Mas o que pouca gente sabe é que essa lógica também pode revolucionar a maneira como são tratados os materiais radioativos.

Em entrevista para a ONU News, o especialista em remediação ambiental da Agência Internacional de Energia Atômica, Aiea, Horst Monken-Fernandes, explicou como esse “novo desenho da economia” pode contribuir para salvar vidas.

Especialista fala de usos benéficos de material radioativo

Solução para escassez de elemento que trata câncer

“Hoje existe uma crise mundial na produção de um radionuclídeo, o chamado Actínio-225, que é usado na terapia de tratamento de câncer. Isso é uma coisa que talvez as pessoas não saibam. Sempre existe uma visão das questões relacionadas à radioatividade e a área nuclear sempre muito negativa pelo lado dos riscos associados. Mas existem muitos benefícios que precisam ser colocados. Então o uso de elementos radioativos em tratamentos médicos é bastante amplo e bastante disseminado. E essa escassez desse radionuclídeo em particular é bastante relevante. Então, existem empresas e startups que já estão trabalhando, e já faz algum tempo, na extração desse elemento que eu fale, o radionuclídeo 225, de resíduos de várias indústrias, nos próprios rejeitos de mineração de urânio”.

O especialista afirmou que o reaproveitamento de material radioativo descartado pode reduzir a pressão sobre os recursos naturais do planeta, que se intensificou nas últimas décadas.

O câncer é uma das principais causas de morte entre crianças e adolescentes em todo o mundo

Produção de fertilizantes pode gerar gesso para construção civil

No contexto brasileiro, existe um potencial a ser explorado em relação ao “gesso agrícola”, um subproduto da fabricação de fertilizantes que contém fósforo, reduzindo a necessidade de extração do gesso natural.

“No caso do Brasil, particularmente o uso do fósforo-gesso dentro de condições que são condições consideradas seguras, e o fósforo é um resíduo da produção de fertilizante. Ele tem aplicações em vários setores da atividade humana, por exemplo, na agricultura, para melhorar as condições do solo. Na construção civil, o material de construção para edifícios e casas”.

Segundo Monken-Fernandes, esse reaproveitamento pode ser explorado em diversas indústrias, gerando oportunidades econômicas e empregos.

Material radioativo de ocorrência natural

Ele esclareceu que os elementos radioativos de ocorrência natural estão presentes em rochas, solos, água e diversas outras matrizes ambientais, e até mesmo dentro do corpo humano.

“Algumas atividades humanas, como atividades industriais têm o potencial de aumentar a concentração desses elementos radioativos e alguns resíduos e, eventualmente, até em alguns efluentes, em função dessas operações. Que operações são essas? Área de mineração, por exemplo. A gente pode falar na área de fertilizantes, de fosfato. Pode falar na área de nióbio, metais, terras raras, que é uma coisa muito falada hoje em dia, carvão. Tratamento de água, a água que nós bebemos, também tem o potencial de aumentar a radioatividade em resíduos que são gerados”.

Monken-Fernandes explicou que essas atividades são mapeadas há muitos anos e não geram níveis altos de exposição à radiação, a não ser em algumas situações muito específicas.

Uma das funções da Aiea é justamente disseminar padrões de segurança e os critérios que devem ser adotados em diferentes situações para que as pessoas não se exponham de maneira indevida à radioatividade.

Uma plataforma petrolífera em alto-mar na costa oeste dos Estados Unidos

Uma plataforma petrolífera em alto-mar na costa oeste dos Estados Unidos

Desafios na indústria de petróleo e gás

Sobre a indústria de combustíveis fósseis, o especialista explicou que a extração de petróleo em grandes profundidades no mar gera duas correntes de resíduos: as lamas e as incrustações, que se formam dentro das tubulações e equipamentos. Ambas podem conter alguns elementos radioativos.

“Quando você chega a um ponto em que o poço de petróleo já não é mais produtivo, essas plataformas precisam ser desmontadas. E aí você tem uma situação em que a quantidade de resíduos de conteúdo radioatividade natural que vão ser geradas nesse processo, elas podem ser significativas. E nesse caso, você precisa ter o quê? As chamadas rotas de disposição desses resíduos”.

Monken-Fernandes disse que com as devidas inovações tecnológicas é possível estabelecer alguma forma de reutilizar as incrustações oriundas da indústria de petróleo e gás, de modo que “aquilo que é um problema se torne uma solução”.

Criação de mercados e empregos

No entanto, ele afirmou que todas essas estratégias de reaproveitamento dependem de mudanças legais para que esses elementos deixem de ser classificados como descarte radioativo e passem a ser rejeitos industriais, com possibilidade de manejo pelo setor privado sob fiscalização do Estado.

De acordo com Monken-Fernandes, em muitos casos o Brasil realiza apenas o armazenamento desses elementos radioativos, que são então exportados, por um custo alto, para países onde existem condições de fazer a deposição definitiva ou o reaproveitamento, como os Estados Unidos.

O especialista afirmou que se todo esse processo fosse executado dentro do território brasileiro, seriam criados mercados, cadeias de suprimento e várias frentes de trabalho especializado, inclusive demandando mão de obra qualificada.

Por outro lado, ele elogiou a aprovação recente de um enquadramento sobre economia circular, que faz com que o Brasil esteja “muito bem-posicionado nessa discussão”, caminhando na direção de políticas públicas favoráveis a um redesenho das cadeias produtivas. 



Fonte ONU

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